Bancos investem em IA para acelerar avaliação de risco, cortar custos e gerar novos negócios
78% dos bancos no mundo já têm projetos de inteligência artificial, revela a IBM no Febraban Tech; veja mudanças nas operações bancárias no Brasil debatidas no evento por executivos das instituições
Por Matheus Piovesana (Broadcast) e Altamiro Silva Junior (Broadcast)
No mundo, 78% dos bancos já estão implementando pelo menos um projeto que utilize a inteligência artificial (IA) para acelerar as operações e se relacionar com o cliente, conforme o IBM Institute for Business Value (IBV). O estudo, ao qual o Estadão/Broadcast teve acesso com exclusividade, foi divulgado no Febraban Tech, aberto em São Paulo nesta terça-feira, 25, e com programação até a quinta-feira, 27. No evento, o maior do setor no País, executivos dos principais bancos contaram como a IA mudou, e transformará ainda mais, a relação com os clientes e os negócios.
No encontro, o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, definiu a inteligência artificial como uma ferramenta que deve transformar a economia global. No setor bancário, de acordo com ele, a tecnologia pode ser o motor de melhorias em modelos de risco e de relacionamento com o cliente, mas que é preciso garantir que seja implementado de forma responsável.
“Precisamos reconhecer que a IA não é apenas uma ferramenta, mas uma força que muda negócios, empregos e a maneira como nos relacionamos com o mundo”, afirmou.
Os bancos utilizam inteligência artificial há pelo menos uma década para incrementar a análise de risco e a prevenção a fraudes. É por meio dela que são capazes de “barrar” um Pix para uma conta suspeita em tempo real, por exemplo, ou de analisar cadastros de novos clientes.
O que separa as ferramentas novas das anteriores é o fato de que a IA generativa deve ir além de fazer uma transferência ou consultar um extrato. Para os bancos, será uma oportunidade de usar as enormes quantidades de dados que possuem para gerar mais negócios com os clientes, sem necessariamente ampliar a estrutura de atendimento.
“Eu já consigo pedir a um assistente virtual que faça um Pix de R$ 1.000 para um contato em uma IA transacional”, diz o diretor de IA, dados e automação da IBM Brasil, Thiago Viola. “É diferente de quando o cliente vai viajar e pergunta ao assistente qual o melhor cartão de crédito: a IA vai analisar o cliente, os cartões e recomendar quais dão mais benefícios.”
Confira a seguir destaques dos bancos participantes do debate de abertura desta terça-feira, 25:
Itaú
Em debate com outros dirigentes de bancos, o presidente do Itaú, Milton Maluhy, lembrou que a inteligência artificial é um “meio, não um fim em si mesmo” e ressaltou que todos os dados do maior banco privado da América Latina já estão em nuvem – para garantir o armazenamento e o processamento de uma quantidade gigantesca de dados, necessária para um sistema artificialmente inteligente. O banco é a terceira empresa que mais usa o GitHub da Microsoft, um serviço para desenvolvedores.
“No momento atual, conseguiremos capturar o benefício máximo da IA”, disse Maluhy. Para ele, é preciso criar valor para o cliente e simplificar processos, e isso pode ser feito com a ajuda da IA.
O diretor de Tecnologia, Design e Dados do Itaú Unibanco, Ricardo Guerra, afirmou ao Estadão/Broadcast, na semana passada, que no momento a instituição tem mais de 250 casos de IA generativa, surgidos em apenas um ano e meio, Um dos exemplos é a leitura de processos em que o banco é parte, com a geração de conclusões sobre o conteúdo das ações. O próximo passo, segundo ele, é levar a tecnologia para a frente do balcão.
Bradesco
O presidente do Bradesco, Marcelo Noronha, defendeu investimentos em pessoas e contratações de profissionais cada vez mais qualificados em tempos do avanço da inteligência artificial. “Queremos ter 60 mil colaboradores usando a BIA com IA generativa este ano”, afirmou.
“Aceleramos contratações em tecnologia e investimos no futuro”, disse Noronha. “Acredito que a inteligência artificial vai mudar o mundo.”
Noronha disse que o banco já tem 50 iniciativas de Inteligência Artificial Generativa, a tecnologia que permite interação com vídeos, áudios e textos. Mas, ao investir em IA, ressaltou a preocupação de que as ferramentas dessa tecnologia “não alucinem”, trazendo riscos para os clientes ou o sistema.
“Os bancos estarão bem posicionados com a IA responsável, pois lidam com riscos”, disse.
Santander
No mesmo debate, o presidente do Santander, Mario Leão, disse que o Santander quer ter um copiloto de inteligência artificial na assessoria de investimentos dos agentes autônomos. “Esperamos ter até final do ano copiloto ia no atendimento do canal remoto”, disse o dirigente, ressaltando que, nessa tecnologia, o foco é no desenvolvimento de códigos.
O presidente do Santander também abordou a questão ambiental. Afirmou que a visão de risco climático precisa mudar de nível após a tragédia com as fortes chuvas no Rio Grande do Sul.
No banco espanhol há a crença de que o ESG, sigla para em inglês para critérios sustentáveis, sociais e de governança, é um negócio, além do posicionamento institucional.
“Temos de ajudar a neutralizar as cadeias de produção”, disse na abertura do Febraban Tech, em debate.
Banco do Brasil
O maior banco público brasileiro planeja utilizar inteligência artificial generativa para dar recomendações financeiras a empresas de pequeno porte. A tecnologia será inserida na plataforma do Banco do Brasil destinada à gestão do caixa destes clientes, que tem cerca de 140 mil usuários, e que permite gerenciar inclusive contas de outras instituições.
Chamada de Ari, a ferramenta dará recomendações a partir dos dados de fluxo de caixa das empresas. Terá alertas sobre pagamentos futuros e sobre os patamares de venda de cada negócio, e também recomendações sobre maneiras de impulsionar as receitas, por exemplo.
“Usando a IA generativa, vamos acelerando esse processo (de recomendação), automatizando e entendendo como o cliente funciona”, afirma Luciana Barbosa, gerente executiva clientes MPE, ao Estadão/Broadcast.
Como mostrou a reportagem do Estadão/Broadcast na semana passada, o BB quer qualificar todos os funcionários do conglomerado, cerca de 125 mil, para que utilizem ferramentas de inteligência artificial e entendam como a tecnologia funciona.
Caixa
O presidente da Caixa Econômica Federal, Carlos Antônio Vieira, disse que o banco público tem uma economia diária de R$ 1 milhão com uso de Inteligência Artificial no crédito imobiliário, o carro-chefe do banco no crédito. “Levávamos três dias para ter um dossiê de crédito imobiliário. Com IA, levamos três horas”, comentou no debate da abertura do Febraban Tech.
Vieira citou que, com o uso da IA, conseguiu trocar quase R$ 16 bilhões em crédito, em troca de dívida velha por nova, a novação.
O executivo também disse que o banco tem dificuldade de recrutar empregados, mas a equipe tem mostrado conhecimento em tecnologia. “Uma transformação cultural está acontecendo na Caixa a partir dos empregados”, disse ele, mencionando que o banco público tem grupos de funcionários fazendo grandes mudanças na empresa.
Segurança
A pesquisa do IBV, feita com cerca de 2.000 bancos e 600 executivos do setor ao redor do planeta, apontou também preocupações dos executivos com questões de segurança.
Dos CEOs ouvidos na pesquisa da IBM, 76% apontam o potencial de novas brechas em cibersegurança; 72% veem potenciais casos de insegurança jurídica; 67% apontam dificuldades no controle da precisão dos resultados; e 65%, preconceitos graças aos vieses dos modelos que servem como “motor” para as ferramentas.
Um dos percalços da aplicação de IA generativa no atendimento direto ao público é o fato de que ela “alucina”: a inteligência artificial sempre dará uma resposta à pergunta que recebe, mas nem sempre essa resposta estará correta. No setor bancário, isso traz riscos.
“Temos de assegurar que a IA seja aplicada com rigor científico e ético”, afirmou o presidente da Febraban, Isaac Sidney.
No caso dos bancos, riscos significam maior exigência de capital. Pelas regras de Basileia, que norteiam a mensuração dos riscos que cada banco corre, os riscos em processos internos, falhas humanas e de sistemas e de processos judiciais são contabilizados no chamado risco operacional, que no Brasil, é o de segundo maior peso para as instituições.
Na América Latina, os bancos têm quatro grandes objetivos com a implementação da tecnologia: aumentar o engajamento dos clientes (31%); incrementar operações de risco, compliance e segurança (25%); aumentar a produtividade em recursos humanos, marketing e compras (também com 25%); e o desenvolvimento na área de tecnologia da informação (19%).
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Foto: Supatman
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