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‘Branding é olhar o passado e o contexto atual e projetar isso para o futuro’

Autora do best-seller ‘A (R)evolução do Branding’, Ana Couto fala sobre mudanças no marketing das empresas desde o século 20 até hoje

‘Branding é olhar o passado e o contexto atual e projetar isso para o futuro’

Por Nathalia Molina

Quando voltou para o Brasil após um mestrado em Nova York, em 1993, Ana Couto se surpreendeu ao constatar que nenhuma empresa brasileira figurava entre as cem mais valiosas do mundo. De lá para cá, a profissional de branding trabalhou para mudar esse cenário. Embora veja avanços nas marcas do País, ela acredita que ainda falta um tanto para conseguirem gerir valor e se tornarem globais.

“Estamos muito aquém do que poderíamos em termos de valor. Outros países, como os Estados Unidos, sempre tiveram uma construção de valor pelo consumidor e a mentalidade de marcas globais. Deixamos muito valor na mesa”. “O branding não é uma questão só de mudança de marca, é a gestão do valor do intangível das organizações.”
Ana Couto CEO da agência anacouto e da LAJE, plataforma de conteúdo e aprendizagem

Em seu livro A (R)evolução do Branding, lançado neste ano pela Editora Gente, ela conceitua três ondas de valor. Produto: reconhecimento de marca, custo-benefício e diferenciais. Pessoas: identificação, fidelização e conexão emocional. Propósito: valores, ecossistema de negócios e mobilização da sociedade. Nesta entrevista, Ana fala sobre essas e outras mudanças ocorridas desde o século 20 até o atual.

As empresas brasileiras conhecem de fato o conceito de branding e aplicam bem isso?
A gente está muito aquém do que poderia em termos de valor. Tem um contexto de brasilidade que não podemos não levar em consideração. Outros países, como os Estados Unidos, sempre tiveram uma construção de valor pelo consumidor e uma mentalidade de marcas globais. Quando eu volto em 1993 (de um mestrado em Nova York), eu falo: “A gente não tem nenhuma marca entre as cem mais valiosas do planeta e tem três nas 500. Ao mesmo tempo, a gente é a décima economia”. A gente deixa muito valor na mesa. O branding não é uma questão só de mudança de marca, é gestão do valor do intangível das organizações. Se fala muito de números, market share, novos modelos de negócios, compra de empresa. Mas, se você não tiver uma estratégia de branding para alinhar isso, está perdendo valor.

Diante da importância dessa estratégia bem estruturada, como funcionam as três ondas de valor de que você fala no seu livro: produto, pessoas e propósito?
O século 20 foi de expansão do consumo e auge do marketing. Você falava de produto, preço, promoção. No século 21, o jogo é outro. Vemos questões climáticas, de externalidades das organizações. Antes, a empresa existia para gerar valor só para o acionista. Agora precisa ser para todos os stakeholders, até porque um está interligado ao outro. Aí entramos na visão das três ondas de valor do branding.

Como as marcas podem se adaptar a novas demandas sem perder a essência?
O branding é olhar o passado e o contexto atual e projetar isso para o futuro. As marcas fortes globais respeitam muito seu DNA. Você pega a Coca-Cola, ela vem evoluindo com respeito à sua história. Quando a Louis Vuitton chama o Pharrell Williams para trabalhar na linha masculina da marca, ela pode evoluir porque respeita o seu código genético.

O branding deve ser moldado pelo regional?
O McDonald’s chega ao Brasil e vende água de coco. O contexto é imponderável, só que você tem que saber quem você é para interagir e não se perder.

As redes sociais mudaram o jogo do branding? Qual é o papel dos influenciadores?
Você pega uma Rihanna da vida, uma Beyoncé da vida, ou uma Bianca Andrade, ou uma Camila, elas têm um poder de influência muito grande. É um jogo importante, mas é um jogo também perigoso. Uma é que elas estão fazendo seus negócios. Então, a Rihanna já tem bilhão em produtos de beleza e lingerie. O outro ponto perigoso é ter um garoto-propaganda que, como o Kanye West fez com a Adidas, começou a ter um discurso péssimo, racista. A Adidas perdeu porque fez uma linha toda com o cara.

Este é um caderno de dez anos do Estadão Marcas Mais. O que mudou nesse período?
A gente ganha o jogo na execução e na mensuração de valor o tempo todo. O contexto mudou muito. A tecnologia possibilitou uma democratização do branding de uma forma extremamente positiva. Hoje todo mundo pode vender pelo Instagram. A consciência dos executivos brasileiros aumentou muito.

Como jurada de premiações internacionais, Cannes, AD&D Awards, você conseguiu perceber essa evolução do branding?
Esses eventos trazem um recorte muito legal da criatividade, da execução, do impacto, da diferenciação. Se você tiver um bom amálgama de branding, você traz essa diferenciação de uma forma muito clara nas ações. Você vai para Cannes, e toda a campanha do Volvo que fala de segurança é a que ganha a maior premiação. Com todas as ferramentas agora de inteligência artificial, a gente vai ter que aumentar o poder do branding, de diferenciação, de criatividade, de realmente buscar propostas de valor únicas. O nosso sarrafo está cada dia mais alto.

Foto: Napoleon Fujisawa/Divulgação