A pandemia escancarou a importância de promover a inclusão digital das pessoas acima de 60 anos, tanto por motivos práticos quanto emocionais. Com a necessidade de isolamento social, as ferramentas de comunicação online se apresentaram como o recurso que permite não apenas ouvir a voz, mas também ver as pessoas queridas. Além disso, a internet oferece as mais diversas opções de consumo e entretenimento para todas as faixas etárias, inclusive essa – e vem se consolidando como canal de acesso a serviços públicos e de cidadania, a exemplo de previdência social, emissão de documentos e registros de boletins de ocorrência.
As estatísticas demonstram, no entanto, o quanto a faixa etária acima dos 60 anos enfrenta um imenso gap de inclusão digital: apenas 44,8% dos brasileiros nesse grupo haviam acessado a internet ao menos uma vez ao longo dos três meses anteriores à realização da PNAD, pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que investigou o tema. Trata-se de uma queda brusca em relação às faixas etárias anteriores – mesmo na imediatamente anterior, entre 50 e 59 anos, o índice de adesão ficou em 74,3%.
O comércio online certamente se beneficiaria muito da participação mais ativa desse público. Isso vale para o momento atual e valerá ainda mais no futuro, considerando-se o envelhecimento da população brasileira. Projeta-se que a participação da faixa acima de 60 anos na pirâmide etária do País dobrará até 2060, passando dos atuais 8% para 16%. Em números absolutos, isso significará saltar de 17 milhões para 36 milhões de pessoas.
Beabá do online
“A distância que muitos idosos mantêm da internet é resultado da soma entre resistência cultural e dificuldade para encontrar quem possa ensiná-los. Filhos e netos nem sempre têm o tempo, a paciência e a didática necessários”, diz Renata Machado Inácio, gerente de um projeto de inclusão digital recém-implantado pela Associação dos Aposentados e Pensionistas de Volta Redonda (RJ), uma das maiores do gênero no País, com 20 mil associados – muitos deles ex-funcionários da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN).
O projeto, que terá a primeira aula em 4 de abril, prevê oito aulas com duas horas de duração, ao longo de um mês. São 23 vagas presenciais para Volta Redonda e outras 23 divididas entre dois municípios próximos, Barra do Piraí e Pinheiral. “A procura tem sido grande. Já estamos com lista de espera para a segunda turma”, conta a gerente. Quem quiser acessar o conteúdo pela internet também terá essa possibilidade, por meio de uma plataforma desenvolvida especialmente para o projeto.
Considerando-se o propósito de “alfabetização digital”, os temas do curso correspondem ao beabá da internet – principais recursos dos smartphones e notebooks, acesso a sites como Facebook e YouTube, produção e envio de fotos e vídeos, dicas de segurança. A ideia é evoluir posteriormente, nos futuros módulos, para usos mais sofisticados, a exemplo de compras online e movimentações financeiras. “Quem já nasceu mexendo na internet ou lida com computadores há muitos anos nem sempre entende as dificuldades dos mais velhos. Isso alimenta mais uma causa da resistência que eles muitas vezes demonstram: a vergonha”, observa Renata.
Nível de inclusão digital é ponto fraco do País
O quanto a internet brasileira é inclusiva em comparação a outros países? No ranking The Inclusive Internet, produzido pela revista The Economist, o Brasil aparece na 36ª colocação entre os 120 países avaliados. Das quatro dimensões levadas em conta, o melhor desempenho do País – 16º lugar – está em “Acessibilidade”, que examina o custo de acesso em relação à renda.
Nas dimensões “Relevância” (que analisa a extensão de conteúdo em idioma local e a relevância desse conteúdo) e “Disponibilidade” (que avalia a qualidade e a amplitude da infraestrutura disponível), o Brasil ocupa posições intermediárias – 40º e 48º lugar, respectivamente.
O ponto fraco do País (69º lugar) está em “Prontidão”, relacionada à capacidade de desfrutar dos recursos oferecidos pela internet – incluindo habilidades, aceitação e políticas de apoio. “O desempenho nessa categoria, que se deve em parte à alfabetização digital abaixo da média, arrasta para baixo a pontuação geral do Brasil”, observaram os responsáveis pelo estudo. Os três líderes do ranking são Suécia, Estados Unidos e Espanha.