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Na era do imediatismo, concentração é quase um superpoder

Com o aumento do tempo de tela e vídeos cada vez mais curtos consumidos nas redes sociais, escolas e pais adotam estratégias para desenvolver a atenção dos jovens

27 de setembro de 2024

Por Diego Brito

Uma linha do tempo repleta de vídeos e textos curtos e conteúdos rasos em meio a um bombardeio constante de estímulos visuais. Independentemente da rede social, esse é o padrão atual das plataformas que capturam a atenção, o tempo e até moldam o cérebro de crianças e adolescentes. Diante desse cenário, escolas e pais buscam adotar estratégias para desenvolver a concentração e a persistência nos jovens.

O palestrante e empreendedor da área de educação corporativa João Henrique Ribeiro, de 53 anos, tem duas filhas matriculadas no Colégio Rio Branco: Carolina Szechtman Sitzer, de 13 anos, que está no 8º ano do ensino fundamental, e Natália Szechtman Sitzer, de 16, do 2º ano do ensino médio. Dentro de casa, ele percebe como a distração digital atinge cada uma das adolescentes.

“Notamos que elas têm formas diferentes de estudar. Natália, a mais velha, é extremamente focada e com raciocínio naturalmente mais lógico, enquanto Carolina é mais distraída. A Natália começa a estudar e só para quando se sente segura de que já tenha todo o conteúdo na cabeça. Carolina, por outro lado, faz interrupções ao longo do período de estudo e, por vezes, deixa parte do conteúdo para estudar mais tarde, como ela costuma dizer. Vale destacar que as duas têm excelentes resultados escolares”, conta o pai.

Ribeiro também afirma que o acesso constante a conteúdos rápidos e imediatos, como vídeos curtos, “talvez seja o grande desafio dos tempos em que vivemos”. Para ele, a falta de paciência para aprofundar temas e consumir conteúdos mais relevantes pode gerar impactos na capacidade e no pensamento crítico dos jovens. “A ideia de que qualquer pessoa pode gerar conteúdo, se por um lado democratiza a informação, por outro, pode gerar conteúdos rasos, desinformação e alienação. Por isso, é importante criar consciência e capacidade de pensamento crítico.”

A vida no offline
É no dia a dia que Ribeiro e a mãe das meninas, Shirley Szechtman, adotam estratégias para aprimorar a concentração das filhas. A tarefa não é simples, mas há esperança de render frutos valiosos no futuro.

“Atividades em família que demandem concentração e um tempo maior juntos auxiliam nesse processo. Sempre buscamos assistir a filmes e séries juntos e longe das telas de celular. Visitar familiares, situação que muitas vezes parece enfadonha, também contribui para que elas entendam a importância da convivência, que vai além dos amigos virtuais. Outra atividade que estimulamos são as extracurriculares, especialmente as esportivas e ligadas à arte. Natália adora esportes, e Carolina é mais ligada às artes e à leitura”
Shirley, mãe de Natália e Carolina

O papel da escola
Se em casa o pai e a mãe se desdobram nas estratégias, fora de casa essa função é passada para a escola. Diretora-geral do Colégio Rio Branco, Esther Carvalho afirma que, com certeza, o principal desafio é competir com a velocidade e o imediatismo das plataformas digitais que oferecem recompensas instantâneas. “Os alunos estão cada vez mais habituados a receber informações de maneira superficial, o que dificulta o envolvimento em tarefas que exigem reflexão, análise e paciência. Além disso, o tempo de atenção reduzido também impacta a capacidade de manter o foco em atividades que demandam esforço cognitivo mais prolongado”, explica.

Diante desse desafio, o colégio apostou em diversas frentes de auxílio aos estudantes. As estratégias pedagógicas utilizadas para melhorar a concentração e a persistência dos alunos incluem a divisão de tarefas complexas em etapas menores, permitindo que pequenos marcos de sucesso sejam alcançados ao longo do processo. Além disso, metodologias ativas, como a aprendizagem baseada em projetos e a resolução de problemas, são aplicadas para aumentar o engajamento dos estudantes e incentivá-los a continuar em busca de resultados. A gamificação, que estabelece metas progressivas, também se mostra uma ferramenta eficaz para manter o interesse e a motivação dos alunos.

O tempo excessivo de tela, somado ao imediatismo das redes sociais, é tema de um debate que está em pauta na educação e na saúde no Brasil. A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) orienta que crianças menores de 2 anos não devem ser expostas a telas, enquanto o tempo de uso para crianças entre 2 e 5 anos deve ser limitado a uma hora diária. Já para crianças de 6 a 10 anos, o uso de telas deve ser restrito a duas horas por dia, e adolescentes entre 11 e 18 anos não devem ultrapassar três horas diárias, incluindo televisão e videogames. A recomendação também inclui que crianças até 10 anos não usem dispositivos eletrônicos em seus quartos e que não tenham smartphones antes dos 12 anos.

Reconhecer o problema
No Colégio Magno/Mágico de Oz, a estratégia pedagógica é expor a dificuldade que os alunos enfrentam para que eles, de fato, entendam o quanto o imediatismo é prejudicial. “Quando mostramos a dificuldade, eles compreendem o motivo da batalha. O aluno que tem uma dificuldade precisa saber que ela existe para que ele possa buscar ferramentas para superá-la. Esse reconhecimento é o primeiro passo para desenvolver a persistência”, afirma a diretora do colégio, Cláudia Tricate.

A recepcionista Sabrina Mariano, mãe de Sophia Mariano, de 9 anos, estudante do Colégio Magnus/Mágico de Oz, se preocupa com o fato de a filha ficar apenas no digital. “Prezo muito pela socialização. Quero que ela prefira uma conversa ou o contato direto com as pessoas, em vez de ficar sempre no celular. Quando ela está sozinha, o celular acaba sendo uma companhia, mas eu quero que ela mantenha o equilíbrio e valorize as relações reais”, exemplifica.

Independentemente da escola, há um consenso entre pais e diretores sobre o uso de celulares e todos os problemas que ele pode trazer: todos desejam que seus filhos tenham uma vida além das telas.

Com o objetivo de fornecer segurança jurídica para Estados e municípios que já discutiam o tema, o Ministério da Educação (MEC) está preparando um projeto de lei para proibir o uso de celulares em escolas públicas e privadas no Brasil, com previsão de divulgação em outubro. Em julho, a Unesco sugeriu o banimento de celulares nas escolas, destacando países como França, EUA e Finlândia, que já adotam essa restrição.

Atenção e concentração em tempos digitais
O tempo de exposição às telas é uma realidade inescapável, mas é importante observar os efeitos disso no comportamento e na capacidade de foco dos alunos. A relação imediata com conteúdos curtos pode prejudicar o desenvolvimento de habilidades como paciência e persistência.

Ao reconhecer os desafios que o mundo digital impõe, os pais podem contribuir para que seus filhos desenvolvam uma visão mais crítica sobre o uso da tecnologia, evitando a alienação e promovendo um equilíbrio saudável entre as interações virtuais e o mundo offline. É importante observar:

O aumento do tempo de tela tem efeitos significativos no comportamento e na capacidade de concentração das crianças. A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) recomenda que crianças até 5 anos não passem mais de uma hora por dia em frente às telas, enquanto para adolescentes o limite é de três horas diárias, incluindo TV e videogames.
Momentos offline em família, embora desafiadores, são fundamentais para fortalecer os vínculos e oferecer experiências que ultrapassem as interações digitais. Essas atividades podem ajudar a combater a superficialidade que domina o tempo de tela.
Atividades extracurriculares, como esportes e artes, são mais do que passatempos, elas estimulam a disciplina e a persistência, ajudando crianças e jovens a desenvolver habilidades de concentração e resiliência.
Observar se a escola adota práticas pedagógicas que favoreçam o foco e a persistência, como a divisão de tarefas em etapas menores, o uso de projetos práticos e o estímulo à reflexão crítica. Essas abordagens ajudam a compensar o impacto do imediatismo digital.

Foto: Colégio Rio Branco/Divulgação

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