Artigo

Inteligência Artificial

IA: impacto e desafios na escola

O uso de ferramentas de inteligência artificial na aprendizagem necessita de diretrizes claras e educação ética para alunos e professores

28 de setembro de 2024

Por Mathias Sallit

A inteligência artificial (IA) generativa se espalhou pelo mundo com a popularização do ChatGPT, ampliando as discussões sobre o tema não apenas no ambiente corporativo, mas também no escolar. Embora haja muito mais perguntas sobre o assunto do que respostas definitivas, sobre um ponto não há dúvidas: a inteligência artificial veio para ficar e seu uso precisa ser debatido de forma madura pela comunidade acadêmica – e, entre esse público, a recepção tem sido positiva. Segundo a pesquisa Perfil e Desafios dos Professores da Educação Básica no Brasil, divulgada em maio pelo Instituto Semesp (entidade que representa mantenedoras de ensino superior do Brasil), 75% dos docentes acreditam que a tecnologia e a IA são aliadas no processo de aprendizagem nas escolas.

Para educadores, as ferramentas de IA facilitam tarefas como organizar cronogramas do semestre, formatar apresentações de aulas e personalizar conteúdos. Elvis Caio de Macedo Lira, professor no Colégio Marista São Luís, no Recife, dá vários exemplos de uso, como gerar exercícios personalizados e fornecer feedbacks em Matemática, auxiliar na tradução e na prática da conversação em Linguagem e simular experimentos e analisar dados em Ciências da Natureza.

Já dentro da sala de aula e nas tarefas de casa, os alunos têm usado essas ferramentas para pesquisar, resolver problemas matemáticos, criar apresentações, revisar textos e até receber feedback sobre trabalhos. Bruno Guanaes Mineiro Rehem, aluno do 1º ano do ensino médio do Colégio Marista Patamares, de Salvador, conta que o uso de IA transformou sua forma de estudar: “A IA me explica os assuntos de forma mais simples, mas erros de conteúdo ou na interpretação dos comandos acontecem”, alerta.

“Aprender requer esforços continuados, oportunidades, currículo adequado e atmosfera de acolhimento. O excesso de respostas fáceis pode reduzir o impulso no engajamento pela descoberta, vital para a criatividade e a aprendizagem”
Ivan Siqueira, professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA)

Desafios
A percepção sobre a falta de confiabilidade de conteúdos produzidos pela IA é um dos muitos pontos de preocupação não só entre os usuários, mas também de especialistas. Os algoritmos de machine learning das IAs coletam e analisam um grande volume de dados disponíveis e, mesmo o processo estando cada vez mais sofisticado, a IA continua sendo apenas uma máquina que nem sempre leva em consideração o contexto, podendo reforçar preconceitos e desigualdades, com pouca diversidade de fontes e apresentando até erros de informação.

Não menos preocupante é a facilidade de utilização da IA para potencializar ações de cyberbullying dentro das escolas – com criações de imagens e vídeos que amplificam a violência repetida que ocorre em alguns ambientes educacionais. “Por isso é fundamental que os estudantes sejam educados a usar [a IA] eticamente, compreendendo os fundamentos dessa tecnologia”, diz Ivan Siqueira, professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e relator da BNCC Computação, documento que complementa a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), com um olhar específico sobre as ferramentas tecnológicas.

Uma outra crítica é o eventual desestímulo que a IA pode oferecer aos estudantes no desenvolvimento do próprio conhecimento. “Aprender requer esforços continuados, oportunidades, currículo adequado e atmosfera de acolhimento. O excesso de respostas fáceis pode reduzir o impulso no engajamento pela descoberta, vital para a criatividade e a aprendizagem”, complementa Siqueira, da UFBA.

Na prática
Uma boa maneira de as escolas enfrentarem esses desafios é estabelecer diretrizes claras sobre o uso da IA, envolvendo na sua implementação professores, alunos e suas famílias. No Colégio Dante Alighieri, por exemplo, uma disciplina dedicada ao tema faz parte do currículo dos alunos do 6º ano do ensino fundamental II até o ensino médio, explicando as lógicas por trás dos algoritmos e a melhor forma de produzir os prompts, ou comandos.

Os professores têm usado a tecnologia como recurso didático em várias atividades, como pedir análises críticas dos alunos após eles produzirem textos, imagens e vídeos com a IA. E os pais são convidados para palestras sobre o assunto. “Mas, apesar da introdução dessas novas tecnologias nas escolas, o papel do professor ainda é central”, garante Verônica Cannatá, coordenadora de Tecnologia Educacional do Dante Alighieri. Ela lembra que é o professor quem conhece os alunos, estabelece vínculos e compreende suas questões socioemocionais, não a inteligência artificial.

Na rede pública
Apesar de o processo ser lento e gerar críticas e desconfortos, é importante que a discussão sobre tecnologia na rede pública também avance, para evitar a perpetuação de desigualdades, diz Ivan Siqueira, professor da UFBA.
Adriana Martinelli, diretora de conteúdo da feira de tecnologia educacional Bett Brasil e consultora de inovação na educação, concorda com a importância do uso da tecnologia e lembra que deve ser atrelado a uma preparação contínua dos professores: “É importante oferecer espaços de experimentação e treinamentos que abordem não apenas o uso técnico, mas, principalmente, estratégias pedagógicas e didáticas”.

Foto: Adobe Stock

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