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Como engajar no papel?

Na era digital, escolas e famílias lidam com o desafio de motivar alunos acostumados a conteúdos rápidos em telas, reforçando a importância dos livros na formação de leitores

28 de setembro de 2024

Por Adriana Moreira

Focada principalmente no público jovem, a Bienal do Livro de São Paulo de 2024 comemorou o recorde de visitantes, ao mesmo tempo que as editoras participantes celebraram o aumento nas vendas. Por outro lado, a pesquisa Tic Kids Online Brasil, divulgada no fim do ano passado, aponta que 95% das crianças e dos adolescentes de 9 a 17 anos se conectam à internet, a maioria em dispositivos móveis. Tudo isso enquanto se debate sobre a proibição dos celulares nas escolas. Mas será que, quando se trata de estímulo à leitura, esses mundos precisam estar desconectados?

Giselly Lima de Moraes, professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e especialista em literatura infantil digital, afirma que “um meio reforça o outro”, mas adverte sobre a necessidade de cautela. Ela destaca que o digital e o impresso são formas de leitura diferentes e não substituem um ao outro, e que a mediação de pais, professores e escolas é fundamental para garantir que as crianças tenham acesso a melhores opções de conteúdo.

Jozimeire Stocco, diretora-geral do Colégio Stocco, em Santo André, com doutorado em Educação, acredita que o analógico e o digital são inseparáveis no aprendizado, mas requerem “organização”. A escola usa tablets a partir do segundo ano do ensino fundamental, mas proíbe o uso de celulares em aula. E investe em bibliotecas com ambientes ajustados para cada faixa etária, tornando a leitura mais atrativa.

Conexões
Priscila Campanholo, gestora de Língua Portuguesa do Colégio Pentágono, em São Paulo, também destaca a importância da mediação na leitura. Ela afirma que a escola busca criar situações que permitam às crianças estabelecer uma conexão com o que leem, refletindo sobre como recebem a obra e o que sentem ao ler ou ouvir uma narrativa.

Eduarda Saltori Greco, de 12 anos, e Arantzazu Begoña Aguirrezabal Bagnara, de 13, alunas do 7º ano do Pentágono, de São Paulo, compartilham uma forte conexão com os livros. “Parece que entramos na história, as palavras descrevem sentimentos que os filmes não conseguem”, diz Eduarda. Arantzazu concorda, afirmando que o livro Extraordinário é muito melhor do que o filme.
Tanto Eduarda quanto Arantzazu dizem que são influenciadas pelas amigas, com quem trocam dicas de livros. “Acabei me interessando por gêneros que eu não gostava”, comenta Eduarda.

Arantzazu, que sempre gostou de ler, relata que, ao ganhar seu primeiro celular aos 10 anos, passou um tempo longe dos livros: “A gente esquece que tem outras coisas além do celular”. Porém, ela retomou o hábito de leitura e hoje usa o celular de maneira diferente, principalmente para jogar ou pesquisar palavras desconhecidas.

Integração
Bruna Toni, professora de história em escolas públicas e privadas, defende que a literatura deve ser trabalhada de forma integrada com outras disciplinas, e não apenas como uma obrigação nas aulas de português, “mas isso exige tempo e apoio aos professores para desenvolver algo mais elaborado”.

Ela lembra que, ao lecionar teatro para turmas de diferentes idades, propôs que os alunos criassem seus próprios roteiros para as peças. Para os mais jovens, sugeriu que trouxessem seus livros favoritos, compartilhassem as histórias e votassem na que gostariam de encenar. “Eles se envolveram no processo e deu muito certo. Até hoje comentam sobre esse projeto.”

No Colégio Pentágono, Priscila conta sobre um projeto que envolve a leitura de jornais impressos. “Um aluno ficou surpreso ao encontrar uma reportagem sobre caminhos para a cura do câncer, algo que ele não estava buscando, mas que o jornal lhe ofereceu”, diz. “É uma experiência de leitura que rompe com as limitações impostas pelo mundo digital.”

Inspirações
Além da escola, o exemplo dos pais como leitores é fundamental para estimular o hábito nas crianças. “As escolas precisam desenvolver projetos de leitura que envolvam toda a comunidade escolar, incluindo funcionários e pais”, diz Bruna Toni. “Crianças e jovens se inspiram no que somos e fazemos. Se queremos causar impacto, o projeto deve ir além dos alunos.”

Para Silvia Adrião, diretora pedagógica da Escola AB Sabin, de São Paulo, “o livro é o material mais revolucionário que a humanidade já inventou, e isso ainda nos impacta. Nossa forma de aprender não mudou, o que mudou foram os meios”. Ela reforça a importância de expor as crianças à literatura desde cedo. Jozimeire Stocco concorda, afirmando que “a leitura do mundo precede a leitura da palavra, por isso é fundamental instigar essa leitura muito antes que as crianças saibam ler”.

10 livros que fazem sucesso com as crianças, segundo Silvia Adrião

“Com Qual Penteado Eu Vou?” – Kiusam de Oliveira
“Amoras” – Emicida
“Falando Tupi” – Yaguarê Yamã
“Kabá Darebu” – Daniel Munduruku
“Todas as Pessoas Contam” – Kristin Roskifle
“Onda” – Susy Lee
“Personagens Encantados” – Ingrid Biesemeyer Bellinghausen
“Bocejo” – Ilan Brenman
“O Rapto da Vitória-Régia” – Renata Adrião D’Angelo
“Chapeuzinho Amarelo” – Chico Buarque

Foto: Colégio Stocco/Divulgação

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