ENSINO SUPERIOR

Uma década de transformações no ensino superior

Dos alunos aos professores, dos cursos às instituições, muita coisa mudou nas universidades em 10 anos. Conheça a nova cara da nossa graduação

Por Amanda Nonato e Isabella Baliana

27 de outubro de 2023

Um ensino superior mais diverso e menos presencial. Em uma frase, esse seria o resumo das mudanças pelas quais nossas faculdades e universidades passaram entre 2012 e 2022 — ano do último Censo da Educação Superior disponível. Foram apenas 10 anos, mas o suficiente para o surgimento de novos perfis de alunos, professores, cursos e das próprias instituições.

Vários fatores influenciaram nesse processo: avanços tecnológicos, atualizações no mercado de trabalho, uma pandemia global que acelerou a modificação de muitos hábitos e leis criadas, como a das cotas, que para Leopoldina Veras, presidente do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif), mudou a realidade das instituições, desse público que não tinha acesso às universidades, de suas famílias, de suas comunidades e dos arranjos produtivos locais

AS INSTITUIÇÕES

Entre 2012 e 2022 foram criadas 171 novas instituições privadas de ensino superior no País, ante apenas oito públicas. Absorvendo 78% dos estudantes matriculados, são as faculdades e universidades privadas que estão puxando o acesso ao ensino superior.

Essa grande diferença fica mais compreensível quando se analisa junto o crescimento do EaD e dos cursos superiores tecnológicos (de curta duração) durante o mesmo período.

Isso porque a grande maioria deles é oferecida por instituições privadas. Em 2022, elas ofertaram mais de 13,3 milhões de novas vagas para cursos na modalidade EaD. Já nas redes federal, estaduais e municipais, esse número mal passou das 100 mil vagas.

Do ponto de vista da distribuição das instituições (públicas e privadas) pelo País, o que chama a atenção é um maior equilíbrio entre as regiões. Enquanto o Sudeste, que sempre concentrou a maior parte de faculdades e universidades, viu o número delas cair entre 2012 e 2022, as Regiões Norte, Centro-Oeste e, principalmente, Nordeste ganharam opções para os universitários. Um sinal de que o ensino superior está ficando menos centralizado.

Total de matrículas por tipo de instituição

Tipo de IES:

Públicas

Privadas

Total

2012

1.897.376

5.140.312

7.037.688

2022

2.076.517

7.367.080

9.443.597

variação %

+9%

+43%

+34%

Fonte: Tabelas de Divulgação | Censo da Educação Superior 2022 (Inep/MEC) – Tabela 3.03

Número de instituições por região

Região

2012

2022

variação %

Centro-Oeste

236

289

+22%

Nordeste

444

611

+38%

Norte

154

201

+31%

Sudeste

1.173

1.098

-6%

Sul

409

396

-3%

Fonte: Sinopse Estatística da Educação Superior – 2012 e 2022 (Inep/MEC) – Tabelas 1.1

“As instituições reconhecem que investir em um docente que tem título de mestre e doutor traz avanços significativos na aplicação de sua metodologia. Por isso, há uma preferência por esse perfil de professor, que tenha se dedicado à sua carreira acadêmica”.
Marina Fontoura, vice-presidente de Novos Negócios e Crescimento da Yduqs, grupo educacional proprietário de instituições como Estácio e Ibmec.

OS CURSOS

Quando olhamos a evolução nos cursos superiores, a mudança que mais impressiona é em relação à modalidade de ensino. O número de estudantes matriculados em cursos a distância (EaD) quase quadruplicou, enquanto nos cursos presenciais houve uma redução de 14%, segundo dados do Censo da Educação Superior. O número de cursos EaD passou de 1.148 em 2012 para 9.186 em 2022.

A trajetória crescente da modalidade começou há mais tempo, mas a pandemia de covid-19, a partir de 2020, acelerou essa transição. Para Aroldo Alves, CEO da Estácio, a flexibilidade do EaD tem contribuído para democratizar o ensino superior: “Em muitas localidades do Brasil, os alunos têm à disposição cursos com uma qualidade que antes era inacessível. O crescimento do EaD é uma realidade que tem o potencial de oferecer oportunidades educacionais a um público mais amplo”.

Mas nem sempre a manutenção da qualidade é assegurada nessa transição de modalidade, o que ainda gera receios. “O que esperamos é que os cursos ofertados em EaD tenham a qualidade que garanta a formação do profissional e que realmente o prepare para o mundo do trabalho”, afirma Leopoldina Veras, presidente do Conif.

Para João Cardoso Palma Filho, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e ex-integrante do Conselho Estadual de Educação de São Paulo, uma forma de os estudantes encontrarem bons cursos é verificando o histórico das instituições de ensino superior (IES) antes mesmo de elas atuarem na educação a distância: “As IES bem avaliadas em seus cursos presenciais tendem a apresentar cursos em EaD com melhor qualidade e muitas oferecem cursos semipresenciais, como é o caso da Unesp, que vem oferecendo o curso de graduação em Pedagogia dessa forma”.

Ocorreram algumas mudanças também na relação dos cursos mais procurados no País. Entre as dez graduações mais populares para os ingressantes no ensino superior, saíram Engenharia Civil, Serviço Social e Empreendedorismo; por outro lado, entraram Sistemas de Informação, Educação Física e Biomedicina. E o curso número 1 em 2022 foi Pedagogia, posto que era ocupado por Administração em 2012.

Matrículas em cursos presenciais e EaD

Ano

Presencial

EAD

2012

5.923.838

1.113.850

2022

5.112.663

4.330.934

variação %

-14%

+289%

Fonte: Tabelas de Divulgação | Censo da Educação Superior 2022 (Inep/MEC) – Tabelas 2.01 e 3.01

Cursos com mais ingressantes

2012

2022

1 – Administração

316.641

1 – Pedagogia

420.436

2 – Direito

227.770

2 – Administração

342.334

3 – Pedagogia

220.228

3 – Enfermagem

241.283

Fonte: Tabelas de Divulgação | Censo da Educação Superior 2022 (Inep/MEC) – Tabela 2.05

OS ALUNOS

O perfil dos estudantes que ingressam no ensino superior no Brasil começou a se transformar impulsionado por políticas afirmativas e mudanças sociais significativas.

E a principal alavanca para essas mudanças foi a implementação da Lei de Cotas, que reserva vagas em universidades públicas para estudantes pretos, pardos e indígenas e, também, oriundos de escolas públicas.

Pelos dados do Censo da Educação Superior, entre 2012 e 2022, o porcentual de alunos brancos matriculados recuou 10 pontos porcentuais, abrindo espaço para uma maior presença de negros (pretos e pardos) que hoje respondem por 46% do total dos universitários, ante 35% em 2012.

Apesar de a Lei de Cotas ser direcionada para instituições públicas, faculdades privadas também passaram a olhar para a pauta da inclusão racial e socioeconômica com maior atenção, oferecendo bolsas de estudo.

Outra forma de inclusão que ganhou força foi a acessibilidade para estudantes com algum tipo de deficiência. A participação porcentual desse grupo de alunos no total de matriculados mais que dobrou em 10 anos, principalmente devido a novas regulamentações, exigindo mais condições de acesso nas instituições.

Ainda assim, essa participação segue muito pequena: menos de 1% dos alunos. Ou seja, considerando os dados do IBGE que apontam que 9% da população brasileira tem algum tipo de deficiência, é preciso avançar.

Matrículas por cor/raça*

Ano

Branca

Preta

Parda

Amarela

Indígena

2012

62%

7%

28%

2%

0,4%

2022

52%

9%

37%

2%

1%

* Descartando-se os registros sem informação ou raça não declarada
Fontes: Censo da Educação Superior 2012 (Inep/MEC) – Tabela 1.10; Censo da Educação Superior 2022 (Inep/MEC) – Tabela 5.6

Presença de alunos com deficiência

Ano

Matrículas de alunos com deficiência

% do total de matrículas

2012

27.143

0,39%

2022

79.262

0,84%

Fontes: Censo da Educação Superior 2012 (Inep/MEC) – Tabela 1.9; Censo da Educação Superior 2022 (Inep/MEC) – Tabela 5.8

OS PROFESSORES

Se há algo que mudou no perfil dos docentes das universidades e faculdades é a exigência de um nível de formação acadêmica cada vez maior. O porcentual de professores do ensino superior com doutorado cresceu tanto na rede pública (+38%) como na rede privada (+84%), além de ter caído praticamente pela metade, nos dois tipos de instituição, o porcentual de docentes que tinham apenas uma especialização como grau máximo de formação.

“As instituições reconhecem que investir em um docente que tem título de mestre e doutor traz avanços significativos na aplicação de sua metodologia. Por isso, há uma preferência por esse perfil de professor, que tenha se dedicado à sua carreira acadêmica”, diz Marina Fontoura, vice-presidente de Novos Negócios e Crescimento da Yduqs, grupo educacional proprietário de instituições como Estácio e Ibmec.

Mas as mudanças não foram proporcionais, se falarmos de diversidade de gênero na categoria. Dados do Censo da Educação Superior mostram que não mudou muito o perfil-padrão de um docente da graduação, que continua sendo mais masculino. Mesmo em um cenário que se mantém desde 2012, no qual as mulheres são quase 60% dos estudantes universitários.

Grau de formação dos docentes

Com mestrado

Com doutorado

Até especialização

2012

2022

2012

2022

2012

2022

IES públicas

30%

21%

51%

71%

19%

8%

IES privadas

46%

46%

18%

33%

37%

21%

Fonte: Tabelas de Divulgação | Censo da Educação Superior 2022 (Inep/MEC) – Tabela 4.01

Foto: Adobe Stock

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