Ensino a Distância

EAD como caminho para a mudança

Por Natália Plascak e Bianca Bibiano

17 de outubro de 2024

Para Josielma da Silva, 35 anos, professora, a possibilidade de estudar a distância representou uma transformação em sua vida. Moradora de Itapevi, na Grande São Paulo, encontrou no curso de Pedagogia na Universidade Virtual de São Paulo (Univesp) a flexibilidade de que precisava para conciliar a rotina de estudos com a de mãe solo de quatro filhos. “Sempre passei muita necessidade. Diante dessa luta, a diretora de uma escola onde eu trabalhava como monitora sempre dizia para eu estudar”, lembra. Assim, em 2018, quando abriram as vagas para o curso de Pedagogia a distância, Josielma contou com o apoio de uma amiga que pagou sua inscrição. Na sequência, foi aprovada no vestibular.

No início estudava na hora do almoço, pelo celular, usando a internet do trabalho. Aos fins de semana, contava com apoio da casa das amigas. Outro grande desafio de Josielma foi se adaptar à vida universitária, diferente de tudo o que já tinha vivido. “Era muito conteúdo, com palavras difíceis que nunca tinha visto. Por muito tempo estudei com um dicionário ao meu alcance. O segundo (desafio) foi a falta de acesso à internet na comunidade onde moro, mas encontrei um fornecedor via satélite e aí tudo começou a melhorar.”

Enquanto ainda cursava a faculdade, começou a prestar concursos públicos e foi aprovada em 12 deles. Em 2024, foi aprovada para lecionar na rede pública de sua cidade e segue atualmente como professora de ensino fundamental. “Penso que o EAD é uma modalidade que alcança todos os grupos de pessoas. Por ser a distância, traz uma flexibilidade para inserirmos o estudo na nossa vida”, analisa.

‘Boom’ de cursos
O número de vagas oferecidas em cursos de graduação na modalidade a distância (EAD) aumentou 84% entre 2019 e 2023, segundo o Censo da Educação Superior, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep). Já a modalidade presencial teve a oferta de vagas reduzida em 9% durante o mesmo período.

Mas o crescimento dos cursos a distância começou muito antes dos desafios trazidos pela pandemia de covid-19 às instituições de ensino: em 2018, eles já respondiam por quase 40% dos ingressantes no ensino superior. Um dos motivos que contribuíram para essa atratividade foi o preço: as mensalidades são mais acessíveis. Outra razão para esse aumento seria uma forte redução de financiamentos oferecidos pelo MEC via Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) a partir de 2015, como apontou o censo do Inep. O programa atendia em sua maioria estudantes de classes mais baixas e, com a falta de recursos, o EAD aos poucos foi absorvendo essa demanda não atendida.

No entanto, a pandemia foi o que acelerou ainda mais essa expansão. A necessidade do isolamento social, o avanço nas ferramentas tecnológicas educacionais e a conveniência de poder assistir às aulas de qualquer lugar criaram ainda outras vantagens para essa modalidade.

MEC ‘de olho’ no EAD
Em junho deste ano, a Portaria 528/2024 do MEC suspendeu até março de 2025 a criação de qualquer curso novo nesse formato e o aumento de vagas nas graduações já existentes. O movimento é de revisão de todo o marco regulatório do EAD até o final do ano. Especialistas e representantes de instituições de ensino superior vêm participando de reuniões com o governo para discutir as atuais regras.

As mudanças, porém, estão longe de agradar a todos. A Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed) não está satisfeita com as suspensões para novos cursos. “Esses atos colaboram para a exclusão social de estudantes que escolheriam o EAD, além de promoverem a concentração de mercado, por retardar que novas instituições de ensino consigam iniciar suas atividades na modalidade”, diz Rita Borges, diretora de Relações Nacionais da instituição.

Na visão dos estudantes
Uma pesquisa realizada com universitários divulgada no início do ano pela Associação Brasileira das Faculdades (Abrafi) mostra que, embora a maior parte dos estudantes (86,45%) tenha consciência de que as graduações presenciais são mais caras, o preço é importante no momento da escolha da modalidade para apenas 31% dos entrevistados. Fatores como qualidade do curso e a tradição da instituição de ensino são os motivos citados como relevantes na escolha de qual caminho seguir.

Para eles, uma das principais vantagens da modalidade EAD é a flexibilidade e a possibilidade de fazer cursos mesmo morando longe do campus da universidade. Já as desvantagens advêm, em sua maioria, de dificuldades com a ambientação no EAD, especialmente quanto à falta de suporte das instituições. Segundo o presidente da Abrafi, Paulo Chanan, a pesquisa também mostrou que essa distância dos colegas, professores e da instituição pode gerar “falta de motivação e inabilidade para montar rotinas de estudos” dos estudantes.

O que muda para quem está pensando em cursar EAD depois da portaria do MEC

Quem for iniciar um curso superior de licenciatura na modalidade terá de cumprir metade da carga horária de forma presencial;
Outros cursos EAD já existentes (bacharelados e tecnológicos) não serão afetados pela regra das licenciaturas. Mas, neste momento, não pode haver aumento das vagas ofertadas;
Pelo menos até março, nenhum curso novo em EAD poderá ser aberto. Instituições que já atuam na modalidade não podem abrir cursos diferentes dos que já são ofertados;
Instituições de ensino que queiram começar a oferecer cursos em EAD terão de esperar o novo marco regulatório;
Os indicadores de qualidade dos cursos EAD também vão mudar. O MEC prevê revisar, até março, os instrumentos hoje utilizados na avaliação dessas graduações.

NÚMEROS

Raio X do ensino superior a distância
Cursos de EAD registrados em 2023: 10.554
Cursos de EAD registrados em 2013: 1.258
97% dos cursos estão no setor privado
3.314.402 ingressantes na modalidade em 2023
Número de vagas no ensino a distância: 19.181.871
Número de vagas presenciais: 5.504.829
*Fonte: Censo da Educação Superior 2023, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep)

Valor médio da mensalidade no EAD: R$ 348
Valor médio da mensalidade no presencial: R$ 1.132
28,9% oferecem desconto por pontualidade no pagamento da mensalidade

Os cursos mais procurados:
1. Administração
2. Pedagogia
3. Análise e Desenvolvimento de Sistemas
4. Contabilidade
5. Gestão de RH
*Fonte: Captação de Alunos no Ensino Superior Privado Brasileiro, do Semesp

32,3% dos alunos preferem estudar na modalidade a distância
63,76% dos alunos gostariam muito que o curso EAD tivesse uma porcentagem de prática presencial
40,92% dos alunos sentem-se sozinhos no ambiente virtual de aprendizagem
*Fonte: Pesquisa Educação em Foco, da Associação Brasileira das Faculdades (Abrafi)

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