Combate às ameaças internacionais

Acúmulo de péssimos resultados leva a indústria brasileira do aço a viver o pior período de sua história. Apesar disso, os investimentos se mantêm

Os resultados de 2016 – e também os obtidos no primeiro semestre deste ano – reforçam o que as empresas de metalurgia e siderurgia já vinham sentindo: o mercado interno não retomará o crescimento em 2017. Pior, o volume de vendas internas de 2013, melhor ano da indústria, deve ser retomado somente em 2028. Por causa disso, resta às companhias do setor continuarem investindo em melhorias de qualidade e produtividade para se manterem crescendo no mercado externo.

O presidente do Instituto Aço Brasil (IAB), Marco Polo Lopes, exemplifica os contrastes do segmento: em 2016, apresentou queda de 6% na produção, de 9% nas vendas e de 14% no consumo interno. Ainda assim, manteve o planejamento de investir US$ 25 bilhões entre 2006 e 2015. “As empresas vêm fazendo um esforço monumental para exportar, evitando assim fechamentos e demissões”, afirma. Este empenho vem dando resultados. Somente no primeiro semestre deste ano, as exportações cresceram 9,2%, ajudando a alavancar a produção em 12%. O crescimento da produção, no entanto, não se reflete no faturamento.

“Os resultados das exportações não remuneraram minimamente as empresas, por conta da não competitividade provocada pelos resíduos tributários, custos financeiros e aumento nos custos de matérias-primas para a produção do aço”, diz o presidente. Para ele, há conflito entre o discurso do governo e a realidade da retomada da economia. E os obstáculos não param por aí.

Lopes lembra que as indústrias nacionais vêm enfrentando uma forte concorrência dos chineses. Não por acaso, as importações brasileiras de aço da China saltaram de 12 mil toneladas em 2000 para 811 mil toneladas em 2016. Em termos percentuais, a participação do aço chinês nas importações saltou de 1,4% para 43,2% no mesmo período. Mais do que isso, a produção anual brasileira corresponde a 14 dias de produção chinesa.

Além da China, o governo Trump também representa uma ameaça. De acordo com Lopes, há por lá a intenção de proibir a importação de aço, considerado pelo novo presidente americano um insumo estratégico. Hoje o Brasil exporta 4,2 milhões de toneladas para os Estados Unidos.

Diante deste quadro, Lopes não vê o mercado interno com otimismo e defende ações mais enérgicas do governo federal para garantir condições de igualdade no mercado internacional. Sobre as vendas internas, o executivo diz que a previsão do setor é retomar o volume interno de produção de 2013 somente em 2028. “Isso com o PIB crescendo 0,5% em 2017, 2,5% em 2018 e acima de 3% a partir de 2019”, comenta.

Produção em alta
Do ponto de vista da competitividade, o executivo elogia algumas ações do governo federal, como a reforma trabalhista e o encaminhamento das reformas previdenciária e tributária. Por outro lado, vê com preocupação pontos como a queda na arrecadação, o aumento nos impostos e as mudanças nas regras do Conteúdo Local. “É necessário restituir impostos não recuperáveis embutidos nos produtos destinados à exportação por meio do Programa Reintegra (regime especial de reintegração de valores tributários para empresas exportadoras), elevando a alíquota dos atuais 2% para 5%”, defende.

Mesmo com essas incertezas em vista, a previsão do IAB é que a produção brasileira de aço bruto termine 2017 com crescimento de 3,8% em relação ao ano passado, chegando a 32,5 milhões de toneladas. As vendas internas de produtos siderúrgicos, por sua vez, devem cair 1,3%, chegando ao mesmo patamar de 2005.

Em 16 anos (de 2000 a 2016), as importações brasileiras de aço da China saltaram de 12 mil toneladas para 811 mil toneladas

CBMM: Estoque de nióbio dentro da fundição no Complexo Industrial de Araxá (MG)

Olhos para o mercado externo

Os últimos anos não têm sido os melhores, mas não foram perdidos. As exportações cresceram, compensando a crise interna

Como outros, os segmentos de metalurgia e siderurgia encontraram o caminho do mercado externo para compensar as perdas nacionais e, mais do que isso, garantir crescimento. Um exemplo de quem usou essa estratégia e se saiu bem é o da Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), primeira colocada na categoria do ranking Estadão Empresas Mais. A instituição fechou o ano de 2016 com mais de R$ 400 milhões investidos na expansão de sua capacidade e, mesmo com a redução da margem EBITDA, viu seu lucro líquido crescer no ano passado. “O ato de sermos majoritariamente exportadores alivia de alguma maneira a volatilidade gerada no ambiente doméstico”, diz Carlos Alberto Bezerra de Moura, diretor da CBMM.

Para ganhar competitividade no mercado internacional, as empresas têm investido em novos processos produtivos, qualidade e logística

O executivo reconhece que a companhia sentiu a retração do mercado local, mas isso não fez com que se desviasse de sua estratégia, que é aprofundar e expandir as aplicações do nióbio, estimulando o crescimento do mercado global. A confiança é tanta que a CBMM investiu, nos últimos cinco anos, mais de R$ 2 bilhões no Complexo Industrial de Araxá, hoje pronto para um novo ciclo de incremento.

Por tudo isso, Carlos Alberto acredita que 2017 será melhor, mesmo com um pouco de retração ainda visível em determinadas regiões. “O comportamento do câmbio tem sido uma barreira, mas estamos confiantes no crescimento das vendas e na recuperação de nossa margem ainda neste ano”, prevê. Não é por acaso que a CBMM está investindo, somente em 2017, mais US$ 40 milhões em iniciativas de desenvolvimento de mercado e aperfeiçoamento de processos produtivos.

Para a segunda colocada na categoria, a ArcelorMittal, 2016 foi o ano que deu início à implementação do plano estratégico global de longo prazo, o Action 2020. Benjamin Baptista Filho, presidente da ArcelorMittal Brasil e CEO da ArcelorMittal Aços Planos da América do Sul, explica que as ações decorrentes do plano ajudaram a reverter as perdas líquidas de 2015 em resultado positivo em 2016. “Há uma meta global de conquistar um EBITDA adicional de US$ 3 bilhões até 2020, e o Brasil tem o compromisso de contribuir com US$ 500 milhões”, revela.

Para cumprir a meta, a operação brasileira tem concentrado esforços no aumento da produtividade e na logística, sempre de olho no aumento da competitividade no mercado internacional. Para Baptista, a companhia deve manter a excelência na produção, otimizar preços de insumos e matérias-primas e investir em produtos e soluções de maior valor agregado, qualificando ainda mais seu portfólio. “Dessa forma, temos conseguido manter nossas plantas com alto nível de ocupação da capacidade e exportar os excedentes que não têm mercado doméstico”, afirma.

Terceira colocada na categoria, a Albras (Atlas Alumínio) também conseguiu atingir a maior parte de suas metas operacionais em 2016. Boa parte desse resultado veio da reestruturação das áreas de Manutenção e Capex, realizada ao longo do ano passado. Para João Batista Menezes, CEO da companhia, esta reestruturação otimizou as paradas operacionais e aumentou a estabilidade dos processos da empresa.

“Nesse sentido, o início do projeto de atualização das pontes rolantes das salas de fornos foi muito importante. Ao longo do ano, conseguimos melhorar a qualidade do anodo – que é o polo positivo do processo de redução eletrolítica do alumínio”, comenta. A Albras também avançou no projeto de recuperação das pontes, contando com o apoio de uma empresa canadense contratada para atuar nesse projeto.