Bancos escolares vazios
Investir em educação aumenta a empregabilidade e garante salários mais altos, mas, em tempos ruins, melhores perspectivas não fazem crescer a procura por cursos
O Mapa do Ensino Superior no Brasil, lançado em agosto pelo Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior (Semesp), revela que os postos de trabalho para aqueles com curso superior cresceram 1,5%, chegando a 9,7 milhões em 2015, na comparação com o ano anterior. E se antes da crise a empregabilidade entre os brasileiros que possuem ensino superior completo estava aumentando, com o desequilíbrio entre oferta e procura de trabalho, a tendência é que o profissional capacitado leve ainda mais vantagem sobre o que ainda não detém diploma do ensino superior. Nem por isso, no entanto, aumentou a procura por cursos superiores no Brasil.
Ao contrário, a partir de 2015 o setor registrou queda no número de novos alunos. Ainda que os dados mais recentes do Semesp deem conta de que o número de estudantes regulares em cursos presenciais e a distância tenha crescido 2,5% de 2014 a 2015, quando totalizou 8,03 milhões – 6,08 milhões de alunos em instituições privadas (76%) e 1,95 milhão na rede pública (24%) –, o mapa aponta declínio de 8% no número de ingressantes (novas matrículas) em 2015. Citando os resultados de uma sondagem realizada pelo Semesp, Rodrigo Capelato, diretor executivo da organização, revela que a queda chegou a 10% em 2016 e deve cair mais 2% em 2017. “No acumulado, o resultado é bastante expressivo e preocupante. Se a trajetória de queda não for revertida, as instituições terão um problema já no curto e médio prazo”, analisa Capelato.
As coisas não vão bem nem mesmo para o segmento de ensino a distância, que vinha crescendo expressivamente até 2014. “O número de ingressantes nessa modalidade teve queda de 2,4% em 2015”, revela o executivo. “O EAD é algo novo, que tem muito para crescer. Não poderia estar encolhendo”, lamenta. A crise econômica é apontada como a maior causa. De um lado, porque a recessão gera desemprego e perda de renda. “Quem perdeu salário desiste do curso superior. Quem não perdeu adia os planos por insegurança.” De outro lado, porque ela leva a cortes de orçamento no governo. A crise do programa de financiamento estudantil do Governo Federal, o Fies, teve importante impacto nos resultados do setor.
O Fies foi um grande impulsionador de ingresso de novos alunos a partir de 2010. Em 2014, 732 mil alunos (40% dos ingressantes) entraram na faculdade por meio do Fies, segundo números do Semesp. Em 2015, os contratos ofertados pelo governo caíram para 287 mil, chegando a 200 mil em 2016, número que deve ser mantido neste ano. “Era uma excelente maneira de se ingressar no ensino superior”, diz o diretor. As instituições investiram e se prepararam para o Fies e agora precisam lidar com o revés. “Mesmo que a economia volte a crescer, eu duvido que elas [as instituições] voltem a apostar no governo.”
Aliás, as políticas governamentais têm influenciado também os resultados do mercado da educação básica privada, que engloba o ensino infantil, fundamental, médio, profissionalizante e de jovens e adultos. “A precariedade do ensino público no Brasil e a falta de segurança da criança na escola fazem com que os pais façam um esforço adicional para manter o filho na escola particular”, afirma Benjamin Ribeiro da Silva, presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo (Sieeesp). O que estamos assistindo, no entanto, é uma espécie de dança das cadeiras no setor. “As mensalidades das escolas particulares variam de R$ 300 a R$ 9.000. Vimos uma movimentação de alunos em direção a escolas mais baratas do que aquelas em que estavam matriculados no ano anterior”, explica.
O Fies foi até 2015 um grande impulsionador de ingresso de novos alunos no ensino superior. Em 2014, 732 mil alunos (40% dos ingressantes) entraram na faculdade utilizando o sistema
Líderes do setor demonstram velocidade de reação
Grupos educacionais se adaptam rapidamente às novas demandas do segmento e garantem crescimento mesmo em meio à recessão
Em uma economia conturbada, com a área da educação apresentando retração nos resultados, puxada pela queda no número de novos ingressantes nos cursos superiores, as vencedoras da categoria Educação do ranking Estadão Empresas Mais mostram que não ocupam a liderança por acaso. Todas elas souberam driblar a crise e crescer mesmo em tempos difíceis. A Kroton, que na última edição do ranking aparecia em segundo lugar, neste ano surge como a grande vencedora da categoria. Carlos Lazar, diretor de relações com investidores da Kroton, afirma que 2016 foi um ano de desafios econômicos e políticos, mas também de importantes conquistas para a instituição. “A companhia investiu quase meio bilhão de reais em qualidade, inovação e crescimento, mantendo o foco e suas diretrizes”, revela Lazar.
Capacidade de adaptação e controle de custos mostraram-se fundamentais para a conquista de bons resultados
No ano passado, a receita líquida pro forma da Kroton atingiu R$ 5,2 bilhões, 4,5% superior em comparação com a registrada em 2015. No ano, o lucro líquido ajustado foi de R$ 2 bilhões, também superior ao do exercício anterior. “Nossa capacidade de adaptação rápida é uma das grandes responsáveis pelo desempenho positivo”, analisa Lazar. Uma amostra disso foi a resposta imediata da Kroton às novas regras e cortes feitos pelo governo no programa de financiamento estudantil (Fies), no final de 2015. “Imediatamente criamos mecanismos de crédito próprio, como o Parcelamento Estudantil Privado (PEP)”, afirma. “Para este segundo semestre, estamos lançando uma joint venture com a BV Financeira, que vem para complementar o PEP.”
Para 2017, a instituição planeja inaugurar 100 novos campi, dos quais 60 já estão sendo analisados pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC). “Outra iniciativa é a ampliação do portfólio de cursos nas unidades atuais”, diz Lazar. Em 2016, a Kroton lançou 275 disciplinas, elevando o total de cursos oferecidos para 2.198. “No ensino a distância, possuímos junto ao MEC novos polos no processo de credenciamento, que, quando aprovados, elevarão nosso número para 1.152”, finaliza.
Ajuste nas contas
A Estácio, segunda colocada no ranking, promoveu ajustes para conter custos e despesas operacionais. Como resultado, viu seu lucro (EBITDA) crescer 28,3% no segundo semestre de 2016, mesmo diante do aumento de apenas 5,8% na receita líquida do período. Pedro Thompson, CEO da Estácio, diz que o grupo espera “uma evolução relevante em todos os seus principais indicadores financeiros e operacionais em 2017”. O executivo destaca o alto índice de satisfação de seus colaboradores como meio para chegar aos bons resultados. Mencionando pesquisa conduzida pelo Hay Group junto a 10 mil respondentes (73% da força de trabalho da Estácio), o executivo afirma que a instituição atingiu 74% de satisfação total.
Outra que agiu rapidamente para fazer frente ao atual cenário econômico foi a Ser Educacional, terceira colocada no ranking. Jânyo Diniz, CEO da companhia, conta que as iniciativas incluíram a implantação de uma área de inteligência competitiva para captação de novos alunos, abertura de novas unidades e cursos em unidades existentes, um sistema proprietário de prevenção de evasão de alunos e a revisão dos projetos acadêmicos. “Tudo isso em paralelo à etapa final de integração de duas aquisições recentes: as Universidades da Amazônia e de Guarulhos”, diz o executivo. Com isso, os resultados da Ser Educacional tiveram melhoria estrutural e sustentável, com a margem EBITDA ajustada passando de 24% para 32% entre 2015 e 2016, e já estabilizada em 2017. O lucro líquido subiu 35% entre 2015 e 2016, com sua dívida líquida reduzindo-se para menos da metade, de R$280 milhões para R$118 milhões no período.